quarta-feira, 21 de setembro de 2011

A força da língua

Lá vai você todo empolgado, falando pelos cotovelos, quando alguém, bem atento, sorri e te diz: “Não é assim que se fala. Você está falando errado!” Você todo constrangido, policia-se para não “errar” novamente. Agora, pare, por um momento, e pense! Não estará você sendo alvo de preconceito lingüístico? Mas, afinal, que bicho é esse? Esse problema surge da crença de que há uma língua única em nosso país. A língua portuguesa é um conjunto de inúmeras variações. Ela varia de acordo com cada região, idade, sexo e, até mesmo, classe econômica.

Mas se são tantas variações, por que somente uma é considerada “correta”? Para chegarmos a esta resposta, precisaremos entender a diferença entre a língua falada e a escrita. A língua falada é viva, dinâmica e inovadora. Ou seja, ela se transforma incessantemente. A língua escrita, por sua vez, é a representação gráfica da nossa fala. Ela, porém, é conservadora, rígida e estática.

Assim, enquanto a língua falada sofre os mecanismos inerentes a ela, alterando-se a cada instante, a língua escrita demora a aceitar as novas mudanças. A norma-padrão, então, é um ideal de língua. Nem mesmo em Portugal há alguém que fale essa variação. Há, sim, muitos, que devido à aproximação com a leitura e ambientes acadêmicos, possuem uma fala mais próxima da língua padrão. Por isso que é chamada de língua culta.

Como tantos outros, a língua também se tornou um instrumento de elitização. Falar “correto” se tornou indicativo de status social. E todo esse condicionamento começou na escola, quando nos obrigaram a aceitarmos uma língua artificial, fora de nossa realidade, de goela adentro. É aquela velha história do pronome “vós”, que a gente só vê na Bíblia!

Portanto, não há um falar “errado” no Brasil. A língua é um organismo vivo e são os seus falantes que a direcionam. Cada variação revela as diferentes tonalidades de nossa língua. A gramática de hoje, por mais conservadora que seja, é um reflexo de nossa fala. Somos nós que definimos o que é o ‘certo”. E a escrita não poderá frear a força da língua do nosso povo!